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Navegando na rede de oferta e na demanda da música digital
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14/03/2013, 09:46
Coordenadoria de Pós-Graduação
Tese desenvolvida na FEC descreve logística e transporte
de ativos, identificando atores envolvidos no processo.
O professor Raul Arellano Caldeira Franco é autor de um estudo único em que descreve um sistema novo e complexo: a logística e especialmente o transporte de ativos digitais na rede de oferta e demanda de música via internet – a Digital Supply Chain (DSC). A tese de doutorado identificando os atores, estrutura, processos, relações, finalidades, fluxos e características econômicas e de serviço de transporte na DSC, orientada pelo professor Orlando Fontes Lima Júnior, foi defendida junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp.
“Na área de logística, a abordagem sempre foi predominantemente física: armazenagem, separação de pedidos, transporte, distribuição de produtos. A questão colocada para o doutorado era se existiria um sistema similar no mundo virtual”, explica Raul Arellano. “A grande lacuna na literatura acadêmica – que traz muito sobre tecnologias, marketing e pirataria – era a falta de uma descrição de como funciona o sistema de logística e de transporte de ativos digitais. Como na biologia, quando se encontra uma espécie nova, é preciso descrevê-la antes de evoluir para outros estudos”.
Na opinião do autor, o principal mérito de sua pesquisa é de ajudar a entender este sistema de distribuição que tem grande impacto não somente na indústria da música, mas em todos os setores relacionados com ativos digitais, como de filmes, televisão, vídeos, player games, publicações, softwares e educação. “Para não ampliar demais o escopo da pesquisa, nos limitamos ao mais simples: a música. Focamos lojas virtuais como o iTunes da Apple e a Sonora do Portal Terra no Brasil, e também realizamos um estudo de caso de um e-tailer (loja virtual de CDs físicos).”
Arellano afirma que, sob a ótica da logística e principalmente do transporte de ativos digitais, é possível desenvolver meios eficientes de alcançar um mercado potencial de mais de 2 bilhões de usuários da internet. “Estudando a estrutura e seus atores, observamos um sistema extremamente responsivo, que dá um atendimento imediato ao consumidor. Quando se pede um CD através da Americanas.com, o produto demora pelo menos um ou dois dias a chegar. Pela DSC, a música chega ao celular, tablet ou computador do comprador em questão de segundos, na forma mais personalizada possível.”
O autor da tese faz uma breve descrição de como funciona a Digital Supply Chain, a partir do processo de criação dos artistas. “A cadeia começa quando a gravadora disponibiliza os ativos digitais máster de músicas (fonogramas) para varejistas virtuais, portais de música, redes sociais ou operadoras de telefonia celular. Estes entregam os fonogramas aos gestores de conteúdo (Content Management Systems), que se encarregam de adequar e proteger o ativo digital para distribuí-lo através dos Gestores de Distribuição na Rede de Entrega de Conteúdo (Content Delivery Network – CDN).”
A maior ênfase dada por Raul Arellano ao aspecto do transporte se deve ao papel fundamental exercido pelos CDNs no apoio às vendas e distribuição pela internet. “Trata-se de uma rede de servidores localizados em datacenters espalhados por todo o mundo, que buscam os ativos digitais das gravadoras ou artistas nos servidores dos gestores de conteúdo (CMS), a fim de distribuí-los em alta velocidade de resposta aos consumidores. Os CDNs atuam como as transportadoras do mundo físico: levam a música aos acessos de rede mais próximos da pessoa que fez o pedido.”
Tudo começou no MIT
O pesquisador informa que a mais relevante dessas empresas de distribuição é a Akamai, detentora de 95 mil servidores localizados em quase 2.000 dos principais provedores de redes backbone e de serviços de internet no mundo, facilitando os downloads pelos clientes. “A Akamai nasceu no MIT [Massachusetts Institute of Technology], quando Tim Berners-Lee (a quem é creditada a criação da World Wide Web) fez uma advertência ao professor de matemática Tom Leighton: que o congestionamento logo se tornaria um grande problema, uma vez que a Web já era um sucesso absoluto.”
Segundo Arellano, Leighton e um aluno de doutorado, Daniel Lewin, começaram a desenvolver um algoritmo inovador para otimizar o tráfego de dados e, em 1998, juntamente com uma equipe de 30 especialistas, fundaram a Akamai. A empresa hoje oferece serviços para sites de grande porte como Facebook, Twitter, MySpace, Yahoo, Apple e Amazon.com. “Os matemáticos do MIT criaram um sistema de monitoramento mundial da internet para roteirizar os ativos digitais desde os proprietários de conteúdos até os servidores próximos dos consumidores. Evitando vias com spam, outras sujeitas ao ataque de hackers ou aquelas que simplesmente caíram, eles fazem com que a Web se torne muito mais rápida.”
A tese de doutorado traz um histórico lembrando que, no final dos anos 1990, iniciou-se o uso do padrão de música ISO Mp3, junto com o lançamento de reprodutores digitais portáteis de música como o Rio PMP 300 da Diamond Multimedia, que podia armazenar até 60 minutos de música. “Atualmente o iPod da Apple pode armazenar até 160 Gb [Gigabytes] ou 40 mil músicas para o consumidor ouvir onde e quando quiser. (...) Uma música no formato Mp3 pode ser baixada em 4 segundos através de uma conexão 4G, ou em 40 segundos com uma conexão de banda larga de 1 Mbps [Megabits/segundo]. Há dez anos isso levaria mais de 5 minutos com uma conexão discada”, escreve o autor.
Na educação
Professor na Extensão da Unicamp pelo Laboratório de Aprendizagem em Logística e Transportes (Lalt) da FEC, e também na Pós-Graduação da Fundação Vanzolini (Politécnica/USP), Arellano considera que a Digital Supply Chain possui grande aplicabilidade na educação. “A tese foca apenas a pontinha do iceberg, de uma revolução que está acontecendo em todas as áreas. Não se trata apenas de música, mas de vídeos, redes sociais, softwares de simulação, que vão demandar muita logística virtual para atender de forma adequada os consumidores de serviços educacionais sedentos por essas novas tecnologias.”
Outro achado de Steve Jobs
O pesquisador Raul Arellano aponta o iTunes da Apple como um exemplo de sucesso devido à Akamai, que domina 70% do mercado de distribuição mundial de ativos digitais e 15% a 30% de todas as transações diárias da Web. “Antes, só era possível comprar o CD, pagando por dez ou doze músicas. Quebrando paradigmas, Steve Jobs teve a ideia da venda a la carte, com o consumidor pagando apenas pelas músicas que quer, a preços variando de 69 centavos a 1,29 dólar (na Sonora, chega a custar apenas 20 centavos de dólar). Foi uma forma bastante inteligente de usar a música para vender indiretamente os produtos de maior valor agregado, já que o cliente vai ouvi-la no iPod, iPad, iPhone ou iMac.”
Informações colhidas por Arellano dão conta de que a indústria da música (no seu sentido mais abrangente) faturou em 2007 e 2008 a cifra global de US$ 160 bilhões. Entretanto, as vendas de música no varejo caíram de um pico de US$ 45 bilhões em 1997 para US$ 25,4 bilhões em 2009. “A indústria como um todo não reduziu o faturamento, que vem até crescendo. O que está ocorrendo é uma transferência, por exemplo, para os shows ao vivo e equipamentos de reprodução musical. Há inclusive um conflito entre os artistas quanto a buscar formas de cobrar pela música ou cedê-la gratuitamente para lucrar com shows e outras formas de merchandising.”
A tese apresentada na FEC, segundo o autor, abordou a defesa dos direitos autorais – aspecto importante para o funcionamento da Digital Supply Chain – mas o processo paralelo de distribuição e obtenção ilegal de música ficou fora do escopo da pesquisa. Um dado preocupante, porém, diz respeito a 1,9 bilhão de faixas de músicas compartilhadas ilegalmente via internet em 2003, estimando-se que tenham chegado a 40 bilhões em 2008 – e que apenas 3,7 bilhões foram vendidas legalmente pela rede. “Mas a música digital já representa entre 20% e 30% do mercado, sendo que a adesão deve aumentar com o custo cada vez menor na compra a la carte.”
Uma última informação obtida por Raul Arellano é que 25% das vendas feitas legalmente são atribuídas ao iTunes da Apple, que anunciou ter mais de 100 milhões de contas em 23 países, 8 milhões de faixas de músicas sem criptografia, 20 mil episódios de TV e 2.000 filmes. Em janeiro de 2009, a loja virtual declarou ter vendido, desde a sua fundação até aquela data, 6 bilhões de músicas. Atualmente, as vendas de ativos digitais através da internet representam 40% do maior mercado mundial de música no varejo, que é dos Estados Unidos.
Publicação
Tese:
“Logística e transportes na digital supply chain: estudo de caso único sobre a rede de oferta e demanda de música digital”
Autor:
Raul Arellano Caldeira Franco
Orientação:
Orlando Fontes Lima Júnior
Unidade:
Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)